quinta-feira, 24 de setembro de 2015

Tu pensas que mandas...

- Vamos dormir?
A resposta não se fez esperar. Do alto dos seus oito anos disse:
- Não.
- Ai sim? Mas já são horas. Vá lá, está na hora de ir para a cama.
Ele nunca perdeu a calma. Sentado no sofá, olhou na minha direção e disse, paciente e condescendentemente:
- Não vou ainda. Ah, e tu não mandas em mim. É um problema, porque tu achas que mandas, mas na verdade não mandas nada.

Eu calei-me. Por pouco tempo. Esclarecido sobre quem mandava em quem, acabou por ir domir sem mais reclamações.

segunda-feira, 21 de setembro de 2015

Motivos pessoais

Sentado à mesa do jantar, olhava fixamente o prato de sopa que lhe tinha colocado à frente.
- Não quero sopa hoje - disse.
- Porquê?
- Por motivos pessoais.
E mais não disse. Escusado será também dizer que a comeu. Toda.

domingo, 20 de setembro de 2015

Audição seletiva

Falei, falei, falei... De repente parei e percebi que ele não me estava a ouvir.

- Estás a ouvir a mãe?
- Claro!
- Fiquei com a impressão que não estavas a ligar nenhuma ao que eu dizia.
- Achas? Claro que não. Eu oiço sempre o que me dizes... quando interessa.

segunda-feira, 14 de setembro de 2015

Um 'vermelho' em casa

Com as eleições à porta, muito se tem falado de politica. Os candidatos esgrimem argumentos, trocam acusações e têm um tempo de antena que conquistou a atenção dele.

- Em quem é que vais votar? - perguntou.
- Não sei. Ainda vou pensar no assunto - disse-lhe.
- Eu sei em quem é que eu votaria se pudesse.
- Em quem? - confesso que estava curiosa.
- No Jerónimo de Sousa [líder do PCP].
- Porquê? - perguntei eu, verdadeiramente surpreendida.
- Porque ele é um senhor de idade. E os senhores de idade são sempre sábios.

quinta-feira, 10 de setembro de 2015

Um comprimido para viver 300 anos

A ideia de eternidade continua a povoar-lhe a mente. Não se cansa de dizer que gostava de viver para sempre e olha para mim na esperança de que lhe diga que sim.

- Gostava mesmo de viver para sempre.
- Mas sabes que ninguém vive para sempre.
- Mas eu gostava tanto!
- Há gente que vive durante muitos anos. Olha o Manoel de Oliveira. Viveu até muito tarde.
- Sim, até aos 106 anos. Mas não viveu para sempre.
Calou-se. Pensou durante uns instantes e voltou à carga.
- Já sei. Vou criar um comprimido que nos permite viver 300 anos. E quando as pessoas chegarem aos 299 anos, voltam a tomar o comprimido e vivem mais 300.
- Mas sabes que para isso tens que estudar muito. Para ser cientista é preciso estar com muita atenção na escola - aproveitei logo a boleia...
- E é preciso dinheiro. Vou começar já a juntar.