quinta-feira, 6 de novembro de 2014

Não me digas que acreditas no Pai Natal

A falta de tempo impede um registo à altura das pérolas que lhe saem da boca. Algumas ficam registadas em guardanapos, antigas faturas, folhetos de publicidade ou qualquer outro pedaço de papel que esteja à mão. É pena. Porque as recordações são importantes. Porque há momentos que, por mais que queiramos, não voltam a repetir-se.
Recuperei estes dois, esquecidos numa mala.

"Tenho uma vida abebezada. É uma vida em que não fazemos coisas de jeito. Queria ter aventuras, encontrar um ladrão, chamar a polícia e e vê-los prendê-lo. Depois ia a correr para casa."
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No meio de uma sessão de leitura do 'Diário de um Banana' descobriu que o marcador que usava para não se perder nas páginas era um cartão com informação sobre todos os dias mundiais e nacionais das doenças.
- O que é a osteoporose? - perguntou sem perder tempo.
- É uma doença - respondi eu, sem lhe dar grande conversa.
- Porque é que não festejamos este dia?
- Não se festejam os dias das doenças. Assinalam-se, para que não nos esqueçamos que é importante lutar contra elas.
- Podemos celebrar esses dias cá em casa? Acho que devíamos fazer uma festa para cada doença. Fazíamos um jantar e convidávamos as pessoas.
- Não me parece - respondi eu, sem saber bem porque é que continuava a alimentar aquele delírio.
- O que é o cancro? - voltou ele à carga.
- É uma doença em que as células do nosso organismo se descontrolam.
- E mata?
- Sim, pode matar.
- A Diana diz que se atarmos um elástico à volta do dedo podemos ter cancro. Depois, tomamos um medicamentos e cai-nos o cabelo.
- Isso não acontece.
- Mesmo se apertarmos com muita força? - disse, ele muito desconfiado.
- Sim, mesmo se apertarmos com muita força.
- E quero ter 17 filhos. - Não sei bem como, nem porquê, passámos de uma conversa para outra sem intervalo.
- 17? Vais ter que arranjar uma casa muito grande!
- Vou viver num apartamento, no Porto.
- Mas vais ter que ter muitos quartos.
- Não, eles dormem em sacos cama, no chão. Espera lá, isto de ter filhos é só dizer que se quer ter e eles aparecem? Ou tem que se ir ao médico pedir um?
Aqui, decidi que era hora de ir dormir.
- Sim, sim, isso. Até amanhã.
- Estás-me a ignorar? - perguntou ele.
- Claro que não, mas já é tarde.
A conversa ficou por ali. No dia seguinte, voltou à carga, desta feita junto do pai, a quem fez a pergunta da praxe: como é que se tem um filho.
O pai respondeu com a também típica resposta da sementinha, mas com um twist final: o pai coloca uma semente na mãe e depois vem a cegonha e traz o bebé.
- Cegonha? Não me digas que também acreditas no Pai Natal!

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